segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013
01:55
Os nossos últimos dias...
Author:
Kuosan
Essa é a janela do décimo andar na Oncologia do Hospital de Base , essa foto foi tirada no dia 17/01/2013 depois de passar dez longos dias acompanhando a minha mãe nos quartos e corredores da ala de internação. Nesse dia, duas horas mais tarde uma ambulância nos buscaria para o Hospital de Apoio, para cuidados paliativos. Ela já estava inconsciente, deitada no leito enquanto respirava com dificuldade, entre a máscara de oxigênio, sonda alimentar e diversos dias de soro intravenoso contínuos.
Nesse dia, e muitos dias depois, eu pensei sobre tudo o que eu e ela passamos juntos. Desde pequeno, afastado de meu pai com problemas graves de saúde, cresci com os mimos de uma mãe que não tinha muitos desejos para a vida, mas sempre tentou me dar o melhor mesmo que isso significasse seu sacrifício em várias pequenas coisas. Às vezes eu me lembro do meu medo de escuro na infância e de como rimos juntos enquanto dividimos uma pizza de calabresa n'um dia em que a energia acabou. Lembro das noites em Taiwan, depois de um longo dia de trabalho , quando as horas da madrugada em um supermercado eram nosso tempo juntos dividindo um pote de sorvete.
Ainda hoje, e sempre, a sua filosofia e pensamentos vão fazer parte de mim: a melhor amiga e companheira que tive desde sempre. Quando eu terminava o ensino médio, em uma tarde um pouco antes do cursinho pré-vestibular, alguns resultados de um exame chamado C.A 15.3 mostraram que ela tinha um cancêr já em estado avançado, com metástase.
Desde então, foram 3 longos anos de luta, com direito a sorrisos e lágrimas, dores e alegrias. No início de 2013, em um domingo, ela estava mal e decidimos juntos que iriamos até o HBDF fazer uma internação para retirar o excesso de líquido em seu pulmão através de uma pleuro-dese Alguma coisa naquele dia fez com que eu tivesse a impressão de que não sairíamos mais de lá juntos.
Em uma maca na emergência do hospital, junto com tantas outras pessoas doentes, eu abaixei a cabeça e encostei em sua mão. Nesse momento, ela perguntou-me porque eu estava triste. A resposta foi rápida: Tenho medo que não vamos sair daqui juntos. Ela sorriu e respondeu " Não se preocupe, vai dar tudo certo. E se não sairmos juntos, não precisa ficar triste, a vida é assim mesmo".
Hoje, um mês depois do falecimento dela, eu finalmente tomei coragem para escrever esse texto, que deveria estar pronto há muito tempo. Não é fácil, a morte da minha mãe me fez perceber muitas coisas. Às vezes existe muita preocupação com coisas que, na verdade, nem fazem tanta diferença. Passamos a vida inteira nos dedicando a encontrar momentos únicos, pessoas com quem possamos ser felizes. Passamos o tempo todo tentando encontrar um melhor uso para o tempo, a vida toda tentando encontrar um sentido para a vida.
Eu gostaria de dizer que, no fim, a saudade é muito maior do que um quarto vazio. É uma falta eterna como uma ferida que não pode sarar, vai ser uma cicatriz para sempre. Perder não é fácil, nunca é fácil, então é preciso amar as pessoas enquanto ainda estamos aqui: respirando, amando e lutando.
Se há algo que eu aprendi com a minha mãe, é que as pessoas devem viver o presente. Amar as coisas mais simples, sempre ser gentil com as outras pessoas. Nossa relação sempre foi muito forte, talvez, por eu nunca ter tido muitas pessoas. Eu vi cada um dos meus avós morrerem cedo, vencidos - outra vez - pelo cancêr. Avós queridos que me criaram desde a infância. Vi meu pai falecer depois de dez anos lutando contra uma insuficiência renal, pai que não era presente , mas não deixava de ser pai.
Talvez eles não fossem os pais mais ricos ou os mais inteligentes, mas eram meus pais e eu me orgulho disso. Eles são parte do que eu sou e que nunca vou deixar de ser. Todos eles que já não estão aqui, cada um é uma pequena parte de mim. Uma sensação, hoje, preenche os meus dias hora após hora. Chama-se Solidão, mas não qualquer solidão que pode ser vencida pela companhia, uma solidão que já faz parte de mim.
A vida é feita de lágrimas e sorrisos, de perdas e ganhos. Nunca foi tarde para dizer que minha mãe - para mim - era a melhor mãe do mundo. Espero que cada um que ame alguém nesse mundo, nunca deixe de dizer e demonstrar. Para cada um que ama, que não se importe tanto com problemas pequenos, com discussões bobas. E que nunca deixem meias-palavras, é preciso dizer o que pensa e pensar o que quer. O tempo é curto demais com quem nós amamos.
É preciso abraçar mais nossos iguais, passear com nossos animais de estimação, nos importarmos menos com a opinião dos outros, gostar mais. É preciso viver mais e reclamar menos, deixar as diferenças de lado. É preciso preparar uma xícara de chá, parar para sentir o cheiro de um perfume, perceber mais o mundo.
Essa é a última foto que tirei dela, no segundo dia de internação, quando uma pequena melhora nos fez acreditar que tudo daria certo novamente. Nesse dia sorrimos juntos e fizemos vários planos. Que não se cumprir jamais. Ela me disse que queria ficar saudável novamente para visitar os lugares que nunca foi, fazer coisas que não havia feito antes. E eu prometi a ela que iriamos para Taiwan juntos quando ela melhorasse. Esse dia, no entanto, não vai chegar. Mas fica a foto, que quando eu tirei , disse a ela que ficaria de lembrança para quando estivéssemos juntos de novo.
Se ainda me resta alguma vontade para lutar, é porque ela dedicou sua vida à mim e eu vou deixa-la orgulhosa. Esteja onde estiver, quero que ela possa tenha orgulho de me ter como filho.
Gostaria de agradecer todos os amigos que estiveram ao meu lado, que são importantes e sempre serão. Muito obrigado. Gostaria também de agradecer à minha família, que me fazem acreditar que um futuro ainda é possível. Um futuro sempre é possível, enquanto ainda temos fôlego para lutar e um coração batendo para amar.
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1 comentários:
Sinto muito, gostaria de ter estado ao seu lado. Nunca imaginei tal coisa. Mesmo eu morando longe, tem o meu carinho sempre!!!
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